quarta-feira, 13 de abril de 2011

Homenagem aos Mestres

Meus mestres estão mortos há tempos, mas seus bocejos de pensamento mais valem do que qualquer brado dos gênios proclamados por nossa geração. Poderia cá fazer uma homenagem citando um ou outro poema de Álvares de Azevedo, Fagundes Varela, Byron, Keats ou outros Românticos - pois todos sabem que para esses o apreço de meu peito é gigantesco. Mas colocarei aqui um soneto injustamente desconhecido de Alphonsus de Guimaraens, dedicado a Cruz e Sousa, poeta que havia visitado em 1885, proclamando-o de "magnífico Cisne Negro".

Ambos poetas sofreram vivos as comparações com os franceses. Cruz e Sousa era o Baudelaire Brasileiro e Alphonsus de Guimaraens o Verlaine dos Trópicos. Tais comparações tinham fundo temático e estético, mas cujos alicerces são quebrados por aqueles que veem suas poéticas com o cuidado necessário para a análise de qualquer obra versada. Mesmo estéticamente, Guimaraens não era igual a Verlaine, pois utilizava de uma métrica própria e que fluía em musicalidade em língua portuguesa. Mesmo tendo o seu livro em Francês, Pauvre Lyre, não era um copiador Velariano. Na opinião pessoal do que escreve, sua tradução de "Chanson d'automne" ("Canção do Outono") do poeta Francês é inferior à de Guilherme de Almeida, algo impraticável a um copiador. Quanto à temática, como Andrade Muricy colocou em seu "Panorama do Movimento Simbolista Brasileiro", Alphonsus de Guimaraens foi monotemático (na verdade, fô-lo nas obras que estão atualmente editadas e sempre à venda. Sua obra completa, organizada pelos filhos Alphonsus de Guimaraens Filho e João Alfonso, em 1960, mostra uma grande poética irônica, de qualidade, que fogem totalmente de sua temática lúgubre tradicional) porque seu isolamento nos "desertos mineiros" - como chamava a região em que morava - fazia que o "Solitário de Mariana" cantasse os mesmos temas por não poder fugir deles, pois era aquilo que o rondava.

Já Cruz e Sousa pouco precisa de defesa. Sua Poética, mesmo rodeada pela Morte - mesmo porque ela o rodeava -, não pode ser considerada uma tradução singela de Baudelaire. É como se considerassem o contexto histórico francês de 1850 igual ao Brasileiro de 1893... É como bradar que o francês penou das dores de Cruz e Sousa, filho de escravos, negro sem mistura, num país sem abolição na lei, mas com a escravidão na alma.
Tolice seria a minha negar a influência que Cruz e Sousa teve de Baudeleire, tal qual a influência que Verlaine tem na poética Alphonsina. O grande ponto é que a crítica acadêmica teima, ainda, em analisar estéticamente a estética do inefável - analisar com olhos vedados a biografia ante a poética.

Diz aqui, então, Alphonsus de Guimaraens a Cruz e Sousa, que morrido havia dois meses antes, como disse Andrade Muricy, "num soneto digno de entrar em Faróis", um dos melhores livros Cruzianos. Eu digo também: um poema digno de se entrelaçar nos véus da eternidade da poesia e, de lá, nunca mais sair.

POETAS EXILADOS

No mosteiro, de velha arquitetura, de era
Remota, vão chegando os poetas exilados.
A porta principal é engrinaldada em hera...
Os sinos dobram nos torreões, abandonados.

Uns são bem velhos e há moços na primavera
Da idade humana. Alguns choram mortos noivados.
Sem esperança, cada um deles tudo espera...
Outros muitos têm o ar de monges maus, transviados.

E ninguém fala. O Sonho é mudo: e sonham, quando
Ei-los todos de pé, extáticos, olhando
A branca aparição de hierático painel.

Chegaste enfim, magoado Eleito! Olham. Vermelhos
Tons de poente num fundo azul... Dobram-se os joelhos:
É Cruz e Sousa aos pés do arcanjo São Gabriel.


Abraços, Cardoso Tardelli

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